Contudo, mesmo nessa ocasião a Igreja como um todo foi tão beneficiada que o pagamento de somas específicas continuou a aumentar. As somas desse modo pagas, é claro, variavam conforme o status, riqueza e dignidade dos “peregrinos isentos”. De arcebispos, bispos, e nobres para baixo até condes, quatro florins de ouro deviam ser pagos; abades e barões pagavam três florins de ouro; nobres menores, doutores e notários, dois florins, todos os demais um florim. (3)
Durante o Jubileu de 1500, o Papa Alexandre VI, cujo amor ao dinheiro era notório decidiu acrescentar algo novo e iniciou a primeira cerimônia da Abertura do Porta Sagrada. O que teria sido a Porta Sagrada ou o que tem sido, jamais foi claramente entendido – exceto que era uma contravenção para atiçar os peregrinos a Roma. Contudo, o Papa e os arquitetos procuravam em vão por essa tal Porta Sagrada na Basílica de São Pedro. A Porta não pôde ser encontrada; assim foi preparada uma, às pressas, a fim de não desapontar os peregrinos que chegavam.
Para ganhar mais dinheiro ainda, o Papa Alexandre VI multou seus representantes, muitos dos quais foram chamados “penitenciários” pela autoridade de reduzirem os dias a serem gastos na peregrinação em pagamento de 1/4 das despesas assim evitadas. Além disso, eles eram também autorizados a compor por “irregularidade”- por exemplo, uma cobrança de simonia – em pagamento de 1/3 das somas adquiridas por esta. Dessa maneira a Basílica de São Pedro foi logo transformada numa verdadeira praça de mercado onde perdões, indulgências, méritos, dispensações e outros privilégios religiosos semelhantes eram vendidos, cambiados, revendidos e comercializados sobre os cofres papais de dinheiro.
Não contentes ainda, Alexandre em 1501 começou a coletar mais dinheiro através do resto da Europa, despachando seus legados a toda parte, vendendo as indulgências com desconto, isto é, por 1/5 do que a peregrinação teria custado aos compradores peregrinos em potencial. Mais de um rei católico, não menos interesseiro e não menos necessitado de dinheiro do que o papa, achou a idéia excelente – para mencionar a mais notória delas, Henrique VIII da Inglaterra, que chegou a um entendimento cordial com o Legado Papal quanto à partilha real dos resultados.
Este foi o último Jubileu antes da Reforma. Em verdade foi o Jubileu que, despercebido a quase todos, plantara as sementes que iriam eventualmente florescer em portentosas árvores que estavam ultimamente para fazer uma estrutura monolítica se quebrar em duas poderosas metades e trazer a emergência do Protestantismo.
Capítulo 9
Milagres, portentos e maravilhas à venda
Tendo em vista que a prática eclesiástica da comercializar os milagres poderia se transformar na mais gratificante fonte de dinheiro; logo se percebeu que quanto mais espetacular fosse o milagre, mais espetacular seriam os lucros dos seus promotores. Os milagres, desse modo, se tornaram uma espécie de investimento religioso, resultando num fluxo firme e inusitado de lucro. O seu aproveitamento dependia não apenas da natureza espetacular ou singularidade dos portentos, mas também das vantagens adquiridas pelos que neles acreditavam, sendo a combinação destes ingredientes o cimento com o qual a Igreja e seus fiéis poderiam se identificar em compartilhar dos resultados visíveis da generosidade de Deus.
Se a venda de indulgências foi um método por demais lucrativo de armazenar riqueza, a explosão da credulidade coletiva do povo católico romano não foi menos proveitosa. A generosidade de Deus poderia ser dispensada, distribuída e manifestada em inúmeras ocasiões pelos mais diversos meios; e nas mais contrastantes e inapropriadas situações e circunstâncias.
Durante a Idade Média e mais tarde, os milagres, portentos e maravilhas e as intervenções de Deus foram de uma variedade jamais vista ou experimentada antes e desde então. Elas refletiam em termos não incertos, a natureza, a credulidade e a mentalidade daqueles influenciados por eles – para não mencionar o espírito do Sistema Religioso, através do qual, via de regra, eles eram operados. Devemos nos contentar com o registro de alguns dos mais característicos; isso indicará não apenas a sua natureza, mas também como eram eles transformados em eventos através dos quais o papado tirou proveito através da coleta de ainda mais lucros.
Um dia o povo de Aspe, na França, organizou um repentino ataque contra seus vizinhos de Saint-Savin. Para evitar que eles vencessem, o Abade de Saint-Savin subiu numa árvore, rezou as orações apropriadas e então os paralisou de modo que foram todos assassinados sem resistência. O papa, informado do massacre, lançou um interdito contra Saint-Savin, com o resultado de que por sete anos ela foi amaldiçoada com a esterilidade das mulheres, rebanho e campos. Para obter absolvição, Saint-Savin concordou com o pagamento anual de 30 sous. (1)
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