“absolvia de toda culpa do pecado todos os que tomaram parte no assalto ao palácio”. (1) (L. B. Simpson, Many Mexico NY 1941).
A violência durou até o dia seguinte, quando o populacho finalmente resolveu incendiar o edifício e abrir as grades. Os guardas do vice-rei abriram fogo e muitos foram mortos. O vice-rei, para salvar a própria vida, fugiu disfarçado e se refugiou num convento franciscano. Tendo derrotado os que desafiavam o poder da Igreja, o arcebispo “fez sua entrada triunfante na cidade, à noite, acompanhado por mais de quatro mil homens a pé e a cavalo, muitos deles portando archotes de modo que parecia ser meio dia”. (2) (Artemio Valle Arizpe, Virrejes y Vircinas de La Nueva España, Madri, 1933).
Na distante Espanha, os distúrbios criaram uma comoção. O rei despachou um investigador real, com o encargo de descobrir quem era culpado e publicar um relatório oficial. Cinco padres foram sentenciados às galeras. O vice-rei foi completamente absolvido.
Enquanto a emissão era fixada pela autoridade do rei, a controvérsia entre a Igreja e o Estado, no México, e de fato através de toda a América Espanhola, continuou a fumegar sob as cinzas de uma desconfortável trégua entre o papado e os mais católicos reis da Espanha.
Os distúrbios da Cidade do México, longe de ser uma disputa local, tinham mais uma vez mostrado às autoridades civis que seria bem mais sábio compartilhar o governo com a Igreja do que governar sem o apoio dela. O Estado representado pelas autoridades coloniais, ou pelo rei, geralmente desisitia, a fim de evitar o pior. O resultado foi que na longa carreira do papado, inverter a situação contra as autoridades civis, ameaçando-as quer com revoltas do tipo do México, ou forçando uma rendição aos seus desejos, levava a adquirir uma influência cada vez maior na sociedade americana. Desse modo, finalmente a Igreja obteve o controle da vida social, econômica e também política das colônias espanholas e assim manteve um estrangulamento do próprio Estado.
A repetição dessas táticas ao correr de alguns séculos, deu um tal poder à Igreja Romana através da América Espanhola, que se pode afirmar, sem exagero, que os papas se tornaram os verdadeiros senhores do Novo Continente. Esse poder foi exercido, deve-se notar, não meramente através do controle de instrumentos políticos, mas indo longe demais no sentido de causar uma completa ruptura nas relações entre a monarquia espanhola e a Igreja Romana. Roma, embora impiedosa, era tão sutil ao ponto de não entender que esses meios poderiam ser empregados para exercer um controle de facto, sem privar o governo da crença de que eram as autoridades civis quem governavam. Consequentemente, enquanto exercia pressão em torno do controle político, ao mesmo tempo executava uma campanha não menos impiedosa pelo controle da sociedade colonial no campo econômico.
As hierarquias coloniais eram encorajadas por Roma a utilizarem sua autoridade religiosa para fins econômicos, usando o populacho conforme as circunstâncias, para fazer pressão contra o governo colonial, como no caso dos distúrbios da Cidade do México. Esta política há muito tem provado ser ainda mais efetiva do que o empenho pelo controle político. Com o resultado de que, enquanto nos antigos dias coloniais o peso da Igreja em assuntos políticos repousava principalmente sobre a pressão religiosa, particularmente através do uso da excomunhão. Mais tarde esse peso deslizou para a pressão que ela veio a exercer através do controle da riqueza econômica. (3)
Essa riqueza econômica foi acumulada através de vários esquemas e o uso simultâneo do status privilegiado da Igreja nos campos espiritual, social e político, enfatizado pelo fato, por exemplo, de que o clero católico sempre tem sido uma classe economicamente privilegiada desde o princípio, recebendo “grandes concessões de terra da coroa”, enquanto aos muitos mosteiros, catedrais e prelados eram oferecidas generosas encomiendas.
Junte-se a isto o fato de que a Igreja foi se enriquecendo com os dízimos e freqüentes “doações e exigência de dinheiro e propriedades, das taxas paroquiais por casamentos, funerais, batismos, confissões e missas, tanto normais como por requiem, coletas especiais em honra de algum santo padroeiro, esmolas arrecadadas nos mosteiros, dotes entregues aos conventos de freiras, e assim por diante”. (4)
Dízimos e exigências mais que tudo, de fato, levaram o enriquecimento à Igreja, à medida em que o tempo corria, de modo que uma crescente proporção de renda colonial e capital colonial caíram no controle eclesiástico. Junte-se a isto o fato de que deveríamos lembrar que o “capital eclesiástico sempre ficou livre de impostos, legalmente no passado e sempre, virtualmente”. (5)
E não foi tudo. Os edifícios, mosteiros, residências eclesiásticas e tudo o mais pertencente à Igreja Romana tinham de ser erigidos gratuitamente, obrigando o estado a fornecer 1/3 a 1/4 dos fundos requeridos, enquanto a população fornecia o restante. Os índios sempre ofereciam mão de obra gratuita como parte de sua contribuição. Isto não estava restrito à construção de igrejas; também se referia a grandes extensões de terra. O resultado é que a Igreja, com o tempo tornou-se um dos principais instrumentos através do qual o empobrecimento das raças nativas continuou, até serem reduzidas a completa miséria. Isto foi causa de intermináveis distúrbios, tendo sido um dos mais notáveis o da Cidade do México causado pelas massas famintas e exaltadas na capital mexicana, em 1692.
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