Corretamente entendido e observado, sabá[1] do sétimo dia (sábado) é uma dádiva preciosa de Deus. Milhões de cristãos na minha comunidade de fé o experimentam como tal. Na criação, “abençoou Deus o dia sétimo e o santificou” (Gênesis 2.3); o mandamento do sabá ecoa, “o SENHOR abençoou o dia de sábado e o santificou”(Êxodo 20.11).
O sabá é também o sinal escolhido por Deus da criação e da redenção: “para que saibais que eu sou o SENHOR, que vos santifica” (Êxodo 31.13); assim, corretamente entendido e observado, o sabá permanece como um antídoto perpétuo tanto para a teoria da evolução naturalística como para o legalismo. Finalmente, o sabá é odia designado por Deus para o descanso e o culto, “o sábado do descanso solene, santa convocação” (Levítico 23.3). A Escritura nunca atribui nenhum desses pronunciamentos sagrados, tampouco confere qualquer significado, a qualquer outro dia da semana além do sabá do sétimo dia.
O Novo Testamento confirma os Dez Mandamentos, incluindo o sabá do sétimo dia, como a vontade de Deus para o seu povo. Referências e alusões aos Dez Mandamentos abundam no ministério de Jesus e no restante do Novo Testamento (por exemplo, Mateus 5.17-19; Marcos 2.27-28; 7.9-13; 10.17-22; Lucas 23.56; Romanos 2.21-22; 7.7; 1Coríntios 6.9-11; Efésios 6.1-3; Hebreus 4.4; Tiago 2.10-12). Era o “costume” de Jesus e dos apóstolos observar o sabá da maneira que seria esperada daqueles que acreditassem em sua universalidade e permanência (Lucas 4.16; Atos 17.2). Jesus cumpriu a lei atribuindo um significado mais profundo aos mandamentos, sem destruir a sua aplicação original (Mateus 5.17-20; 11.28-12.8). O livro de Apocalipse é permeado de alusões diretas e indiretas a, pelo menos, sete dos Dez Mandamentos, incluindo o mandamento do sabá. João recebeu a sua visão no “dia do Senhor” (Apocalipse 1.10).
O Dia do Senhor é a designação da Escritura para o sabá do sétimo dia: “o sábado do SENHOR, teu Deus” (Êxodo 20.10); “meus sábados” (Levítico 19.3); “meu santo dia […] santo dia do SENHOR” (Isaías 58.13); o dia do qual Jesus se disse “senhor” (Lucas 6.5). Se Deus houvesse dado essas designações ao domingo ou a qualquer outro dia, isso não seria citado como evidência para a sua santidade e sua reivindicação exclusiva de ser o “dia do Senhor”? A alusão, em Apocalipse 11.19, à entrega dos Dez Mandamentos no Sinai sugere que as referências subsequentes aos “mandamentos de Deus”, os quais o povo de Deus do último dia obedece em amor por meio da fé em Jesus, incluem os Dez Mandamentos (12.17; 14.12). O apelo escatológico para que se adore “aquele que fez o céu, e a terra, e o mar, e as fontes das águas” (14.7) toma linguagem emprestada diretamente do mandamento do sabá. A evidência escriturística me parece clara e convincente de que os Dez Mandamentos, inclusive o sabá do sétimo dia, são permanentes e universais.
O Novo Testamento jamais muda o mandamento do sabá. As oito referências ao “primeiro dia” nos evangelhos se referem, exclusivamente, ao próprio dia em que Jesus ressuscitou e apareceu aos crentes para lhes assegurar que ele estava vivo, ou ao domingo imediatamente subsequente, quando ele apareceu para convencer o duvidoso Tomé. Os intérpretes que advogam a sacralidade do domingo baseados na referência de Atos 20.7 ao partir do pão no primeiro dia precisam ignorar que os crentes primitivos “partiam o pão” diariamente (2.46; 27.35). Renomados estudiosos de diversas tradições protestantes (as referências estão citadas em meu ensaio no livro Perspectives on the Sabbath: Four Views [N.T.: Sem tradução em português]):
- Consideram que o apelo de 1Coríntios 16.1-2 acerca da “coleta para os santos” no domingo não tem relação com um culto de adoração corporativa;
- Apresentam evidências de que a repreensão de Gálatas 4.8-11 quanto à observância de dias especiais se refere aos dias sagrados pagãos, não ao sabá do Decálogo;
- Ensinam que os “dias” sobre cuja observância cada um deve ter “opinião bem definida em sua própria mente” se referem aos dias judaicos de jejum (“assuntos controvertidos”, 14.1, NVI), e não ao sabá do Decálogo;
- Concluem que a referência a “dias de sábado” (NVI) ou “sábados” (ARA) em Colossenses 2.16-17 não afasta a existência de um sabá do Novo Testamento e apresentam forte evidência de que os sábados sombrios dessa passagem, cuja substância veio em Cristo, são na verdade os sábados cerimoniais do Antigo Testamento, e não o sabá do sétimo dia do Decálogo (cf. Hebreus 10.1-4).
Os judaizantes certamente teriam resistido a qualquer tentativa de mudar o sabá do Decálogo com ainda maior intensidade do que lutaram contra a revelação do Espírito Santo de que a circuncisão, a qual não era uma ordenança da criação nem um dos Dez Mandamentos, não mantinha nenhuma significância espiritual na era do Novo Testamento (Atos 15). Mas nenhum traço de semelhante controvérsia acerca do sabá existe em Atos ou no restante do Novo Testamento. Muito pelo contrário: “A circuncisão, em si, não é nada; a incircuncisão também nada é, mas o que vale é guardar as ordenanças de Deus” (1Coríntios 7.19).
Os dispensacionalistas sustentam que o sabá era exclusivamente para Israel e passou juntamente com a antiga aliança. Se fosse o caso, o mesmo seria verdade acerca dos outros nove mandamentos do Decálogo. Mas, embora de fato Deus tenha escolhido o sabá como o sinal do pacto entre Si mesmo e o “povo de Israel” (Êxodo 31.17), ele também estabeleceu a nova aliança exclusivamente com “a casa de Israel”, a descendência espiritual de Abraão, todos aqueles que “são da fé” (Hebreus 8.8, 10; Gálatas 3.7, 29; ver Isaías 56). Uma vez que tanto a nova aliança quanto o sabá, o sinal da aliança de Deus, foram dados a Israel, se o sabá se aplicasse exclusivamente a Israel, então o mesmo ocorreria com a nova aliança. Contudo, assim como a nova aliança especificamente firmada com a “casa de Israel” se aplica a todos aqueles que “são da fé” (Gálatas 3.7), também o sabá – o “sinal” escolhido por Deus entre Si mesmo e Israel – do mesmo modo se aplica, universal e permanentemente, a todos aqueles que “são da fé”.
Hebreus 4.9 dispõe explicitamente: “Portanto, resta um repouso [no grego, sabbatismos] para o povo de Deus”. Sabbatismos “denota a observância ou a celebração do sabá” (A.T. Lincoln, From Sabbath to the Lord’s Day, p. 213 [N.T.: publicado em português pela Editora Cultura Cristã sob o título Do Shabbath para o Dia do Senhor]). Nunca na Escritura a palavra sabbatismos ou o seu verbo cognato sabbatiz?se referem ao domingo ou a alguma experiência espiritual nebulosa. O “descanso sabático” que “resta […] para o povo de Deus” em Hebreus 4.9 é o sabá instituído na criação, tal como explicitamente indicado apenas quatro versículos antes (Hebreus 4.4, citando Gênesis 2.2): “E descansou Deus, no sétimo dia, de todas as obras que fizera”.
Com efeito, Efésios 5 e Hebreus 4 tratam de modo semelhante o casamento e o sabá do sétimo dia, ambos ordenanças da criação, ao:
- Afirmarem sua origem na criação (Efésios 5.31; Hebreus 4.4),
- Atribuírem a cada um deles santidade e significado mais profundos, com base no ministério expiatório de Jesus e na sua relação com o crente (Efésios 5.32; Hebreus 4.6), e
- Afirmarem a aplicação do casamento e do sabá como ordenanças que permanecem no Novo Testamento (Efésios 5.33; Hebreus 4.9).
O sabá do sétimo dia está indissoluvelmente ligado a Jesus. Jesus, o arquiteto da criação (João 1.1-3), descansou no sétimo dia em celebração à sua obra concluída (Gênesis 2.2) e, como o “Autor e Consumador da fé” (Hebreus 12.2), descansou no túmulo no sabá entre a Sexta-feira Santa e o Domingo de Páscoa, na consumação do seu ministério terreno de redenção (Lucas 23.52-24.2). Como a Rocha espiritual que acompanhava Israel em suas jornadas (1Coríntios 10.4), Jesus anunciou os Dez Mandamentos ao seu povo (Deuteronômio 4.12-13), gravou-os em pedra com o seu dedo (êxodo 31.18) e os escreve no coração do seu povo pelo seu Espírito, em cumprimento à promessa da sua nova aliança (Deuteronômio 30.6, 11-14; Salmo 40.8).
Então, Jesus podia corretamente declarar-se o único legítimo “Senhor até mesmo do sábado” (Marcos 2.28, NVI). Naquela mesma ocasião ele declarou: “O sábado foi estabelecido [no grego, egeneto] por causa do homem [anthropos]” (Marcos 2.27). Egeneto (literalmente, “veio à existência”) ocorre vinte vezes na história da criação em Gênesis 1 e três vezes em João 1.3, o que revela Jesus como o único por meio de quem todas as coisas foram “estabelecidas” ou criadas.Anthropos é o termo genérico grego para a humanidade. Assim, Jesus afirmou a origem criacional e o caráter universal do próprio sabá do qual ele é Senhor.
Assim como Jesus é o foco da nossa adoração sabática hoje, assim também ele o será na nova terra. Nos “novos céus e [na] nova terra […] De uma lua nova a outra [seria melhor traduzir “de um mês a outro”; para referências acadêmicas, ver Perspectives on the Sabbath: Four Views] e de um sábado a outro, toda a humanidade virá e se inclinará diante de mim, diz o Senhor” (Isaías 66.22-23, ênfase acrescida). A referência aos “novos céus e nova terra” em Isaías 65-66 ecoa Gênesis 1-2, vislumbrando a restauração por Deus da terra a condições edênicas. No Éden e na nova terra:
- Aos homens são dadas oportunidades recompensadoras de trabalho (Gênesis 1.26, 28; 2.15; Isaías 65.21),
- Aos animais são dadas plantas por comida (não uns aos outros) (Gênesis 1.30; Isaías 65.25),
- O sabá do sétimo dia é o tempo designado por Deus para descanso e adoração (Gênesis 2.3; Isaías 66.23).
Assim, a observância do sabá do sétimo dia “resta […] para o povo de Deus” (Hebreus 4.9), de modo universal e permanente, como o sinal da aliança e Deus com a sua igreja, demonstrando que ele é o nosso Criador, o nosso verdadeiro descanso e o nosso Redentor – “para que saibais que eu sou o SENHOR, que vos santifica” (Êxodo 31.13). Eu convido você a experimentar o sabá do sétimo dia por si mesmo e ver se a variedade de significados que Deus lhe atribui, assim como as bênçãos da comunhão com Deus que ele oferece na sua observância, não enriquecerão a sua vida e aprofundarão a sua caminhada com Jesus – o seu Criador, Redentor e Senhor.
[1] N.E.: Sabá é a transliteração em português do termo em hebraico. Alguns textos usam sábado ou sabbath (transliteração em inglês). Optamos por sabá por ser um termo em português e distinto do dia da semana. Contudo, não se deve confundir com a rainha de Sabá de 1 Reis 10:4.
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