Uma das canções mais amadas dos cristãos cantadas durante a época de Natal é a de William C. Dix, “What child is this?” (“que criança é essa?”). Como poucas canções, a letra dessa composição nos leva a contemplar a identidade, a pessoa e a obra do bebê na manjedoura. Na verdade, ainda que de forma gentil, mas também persistentemente, força-nos a responder à pergunta: essa criança é realmente um bebê santo ou apenas um bebê para feriados e comemorações?
Quando pensamos sobre essa questão, a maioria das nossas reflexões se detêm nos anúncios do nascimento nos Evangelhos de Mateus e de Lucas. Estas passagens certamente têm seu lugar. Nesta série, contudo, vamos considerar o Natal de acordo com o apóstolo Paulo. Sim, até mesmo o apóstolo reflete sobre as maravilhas do nascimento de Jesus, e ele o faz em Gálatas 4.4-5.
(4) vindo, porém, a plenitude do tempo, Deus enviou seu Filho, nascido de mulher, nascido sob a lei, (5) para resgatar os que estavam sob a lei, a fim de que recebêssemos a adoção de filhos.
O apóstolo Paulo nos diz seis coisas extraordinárias sobre Cristo ao nos responder à pergunta que a canção nos propõe. Nessa nossa primeira parte de uma série de três textos, vamos considerar duas dessas verdades.
Em primeiro lugar, perceba que, de acordo com o apóstolo, Jesus é o Filho pelo qual todo o tempo havia esperado. As palavras de Paulo nos levam a refletir sobre o momento da aparição de Cristo no mundo: “vindo, porém, a plenitude do tempo”. O momento em que Jesus veio é dito como o tempo em seu ponto máximo, uma ocasião única em que todas as partes da história que teriam de ocorrer, de fato, ocorreram. Todo e cada detalhe que deveria ter acontecido agora estava em seu lugar. Claramente, Paulo quer que percebamos que o momento do aparecimento histórico do Filho do Pai foi algo acordado e estabelecido entre o Pai e o Filho desde a eternidade. O apóstolo Pedro acrescenta que o momento da chegada do Filho era uma data que os profetas do passado diligentemente investigaram, que lhes fora revelada e predita por eles (1Pedro 1.10-12). Essas palavras, então, geram em nós a percepção de que o momento do nascimento de Cristo foi de acordo com a determinação de Deus, que, desde toda a eternidade, pelo mui sábio e santo conselho de sua própria vontade, livre e imutavelmente, ordenou tudo o que acontece. Cristo não poderia ter nascido mais cedo, nem mais tarde.
Portanto, se o nascimento de Jesus ocorreu na plenitude do tempo, como é essa plenitude? Podemos resumi-la em quatro características. Foi um tempo de preparação política. O Império Romano trouxera a pax Romana (“paz de Roma”) para o mundo então conhecido e, assim, o mundo se uniu como nunca antes (cf. Lucas 2.1). Foi um tempo de preparação econômica. Os romanos haviam construído um bom sistema de transporte, focado em cinco rodovias principais que saiam de Roma para destinos no mundo antigo (cf. Colossenses 1.23). Foi um tempo de preparação cultural. A língua grega se tornara o meio de comércio, cultura e filosofia (ou seja, a língua franca), e assim era possível que o evangelho e a literatura do evangelho atingissem um público universal. E, finalmente, foi um tempo de preparação religiosa. A fome da alma, individual e social, viera sobre o mundo. O fracasso do paganismo e até mesmo do judaísmo, junto com um renascimento das esperanças messiânicas, caracterizava grande parte do mundo antigo. Assim, em sua frase “vindo a plenitude dos tempos”, o apóstolo Paulo nos aponta para o fato de que, politicamente, economicamente, culturalmente e religiosamente falando, a história fora orquestrada pelo Deus único e verdadeiro. Em particular, pela sua singular soberania e providência, as histórias de Roma e Jerusalém, que figuraram tão proeminentemente na estada do nosso Senhor na terra, convergiram. A data marcada para a chegada do Filho do Pai veio na hora certa.
Quem é esta criança na manjedoura, então? É a criança por quem todo o tempo havia esperado.
Em segundo lugar, as palavras do apóstolo em Gálatas 4.4-5 nos dizem que criança é essa quando ele diz que Jesus é o Filho “nascido de mulher”. Com estas palavras, Paulo começa a refletir sobre as circunstâncias de seu nascimento, que por sua vez dirige nossa atenção para a humilhação do glorioso Filho eterno. Em acordo com profecias como as de Gênesis 3.15 e Isaías 7.14, o Filho nasceu de uma mulher. Ele era, portanto, totalmente humano, bem como plenamente divino, o único Deus-homem. O Filho de Deus foi enviado para ser um conosco em nossa humanidade.
Mas há mais nessa expressão “nascido de mulher”. Veja, o apóstolo conhece a história do nascimento de Jesus. Naquele tempo, era costume falar de “nascer de um homem”, um costume de que as genealogias da época testemunham – exceto a de Jesus. Ele nasceu de uma mulher; na verdade, de uma virgem, como predito pelo profeta Isaías. Esta criança nasceu sem um homem, nascido de uma mulher, o Filho de Deus Pai.
No entanto, “nascido de mulher” nos diz ainda mais sobre esta criança. Ele não foi apenas feito e formado “na mulher”, mas “de mulher”. Isto é, ele nasceu de sua carne e sangue, e participou deles. Essa é a primeira circunstância de seu nascimento a que o apóstolo chama a nossa atenção ao refletir sobre o esvaziamento e grande humilhação do Filho do Pai.
Que criança é essa, então? É o Filho que nasceu de uma mulher, assim como era o filho por quem todo o tempo havia esperado.
Em nossa próxima etapa, examinaremos mais duas verdades que o apóstolo Paulo nos ensina sobre o Natal.
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