É preciso tomar posse do futuro
Cabe a cada um de nós refletir sobre qual será nossa parte como indivíduos e como Igreja neste futuro que já chegou.
Por Carlo Carrenho
“O Brasil é uma democracia desabrochando, um lugar onde as pessoas são livres para falar o que pensam e escolher seus líderes (...). Na última década, o progresso feito pelo povo brasileiro inspirou o mundo. Hoje, metade deste país é considerada classe média. Milhões foram retirados da pobreza. Pela primeira vez, a esperança está voltando a lugares onde antes prevalecia o medo (...). O Brasil foi durante muito tempo um país cheio de potencial, mas atrasado pela política, tanto aqui quanto no exterior. Durante muito tempo, o Brasil foi o ‘país do futuro’ e disseram para que ele esperasse pelos dias melhores que viriam em breve. Meus amigos, esse dia finalmente chegou! Este não é mais o ‘país do futuro’; as pessoas do Brasil devem saber que o futuro já chegou e está aqui agora. É hora de tomar posse dele.”
Tal discurso ufanista e quase nacionalista bem que poderia ter saído da boca de um candidato às eleições presidenciais brasileiras, mas não. As palavras foram proferidas por Barack Obama, presidente dos Estados Unidos, em seu discurso no Teatro Municipal do Rio de Janeiro no último dia 20 de março. Goste de você de Obama ou não, tenha ele escrito o discurso ou não, a verdade é que é um texto primoroso, com palavras fortes e bem planejadas.
Às vezes, é preciso um olhar externo para conhecermos melhor nossa própria realidade. É por isso que as empresas contratam consultores que dizem o óbvio; e é pelo mesmo motivo que muitos de nós fazemos terapia para enxergar o que sempre esteve diante de nossos olhos. A realidade não é muito diferente quando perguntamos a opinião de amigos antes de fazer alguma compra. A auto-imagem é sempre distorcida, em um grau maior ou menor, por nossos espelhos morais e sociais. E é por isso que o discurso de Obama me encantou e me fez olhar o Brasil com outros olhos.
Quase um ano atrás, eu já tinha me deparado com uma edição especial da revista francesa Le Monde sobre o Brasil. Na capa verde-amarela, estava estampado o nome de nosso país sobre os dizeres: “Um gigante que se levanta”. Naquele momento, percebi que o mundo via o Brasil com olhos distintos dos meus e da maioria de meus compatriotas. Pois o discurso de Obama corroborou essa impressão e levou-me a pensar que a realidade brasileira está entre o pessimismo nacional e o otimismo estrangeiro – talvez, mais próxima do segundo que do primeiro. O futuro está aí na porta, se é que já não entrou. Só temos que, como disse Obama, tomar posse dele.
Todavia, o Brasil possui uma história repleta de oportunidades perdidas. Sob um olhar mais pessimista, poder-se-ia dizer que não desperdiçamos uma oportunidade de perder uma oportunidade. No início do século 20, quando o Brasil atraía multidões de imigrantes, nós éramos o país do futuro, mas conseguimos adiá-lo. No período do presidente Juscelino Kubitschek, quando buscamos 50 anos em cinco, tínhamos o futuro em nossas mãos outra vez, mas demos um jeito de destruir a democracia e entrar em uma ditadura militar que nem ganhos econômicos trouxe à nação.
Com o fim da hiperinflação, nos anos 1990, parecia que chegara nossa vez – contudo, tivemos de esperar mais uma década. Agora, eis o futuro novamente aí! Mas, para que ele vire presente, temos de tomar posse dele. O que me deixa otimista, desta vez, é que a realidade social do país melhorou. Goste você do Lula ou não, goste você do Partido dos Trabalhadores ou não, a verdade é que a miséria nacional diminuiu. Seja o mérito atribuído ao governo dos últimos oito anos ou à administração imediatamente anterior, o fato é que uma massa enorme de ex-excluídos agora faz parte do mercado consumidor – e, muito mais importante, possuem vidas mais dignas. Contudo, não vamos nos enganar. Ainda há muito que fazer, como oferecer educação de qualidade, em todos os níveis, para todos os brasileiros. Outras áreas, como saúde pública, previdência social e transportes, também ainda têm de evoluir muito. Só assim teremos liberdade e democracia plenas como já comemorou – talvez um pouco antes da hora – o presidente norte-americano em seu discurso.
Mas agora é hora de ser otimista. É hora de aproveitar a boa imagem do Brasil no exterior com Copa do Mundo, Jogos Olímpicos, austeridade fiscal e até desenho animado, como Rio, do brazuca Carlos Saldanha. Chegou a hora, como disse Obama, de tomar posse do futuro. E cabe a cada um de nós refletir sobre qual será nossa parte como indivíduos e como Igreja neste futuro que já chegou.
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