segunda-feira, 18 de fevereiro de 2013


Legalismo

por R. C. Sproul
O segundo erro principal que leva à falsa segurança é o legalismo, que é outra maneira de referir-se a “obras de justiça”. O legalismo ensina que, para chegar ao céu, você tem de obedecer à lei de Deus e viver uma vida boa. Em outras palavras, as suas boas obras o levarão ao céu. Muitas pessoas, entendendo erroneamente o que Deus requer, creem que têm satisfeito aos padrões que Deus estabeleceu para a entrada no céu.
Certa vez, servi como treinador no ministério Evangelismo Explosivo, levando as pessoas treinadas até à comunidade uma ou duas vezes por semana, conversando com pessoas e fazendo as perguntas investigadoras. Posteriormente, correlacionávamos as respostas que recebíamos. Dentre as respostas, 90% se encaixavam na categoria de obras de justiça. Quando perguntávamos às pessoas o que elas diriam a Deus, se ele lhes perguntasse por que deveria deixá-las entrar no céu, a maioria delas respondia: “Eu tenho vivido uma vida boa”, “Dou o dízimo à igreja”, “Trabalho com os Escoteiros” ou algo neste sentido. A confiança delas repousava em algum tipo de relatório de desempenho que tinham conseguido atingir. Infelizmente, as obras de uma pessoa são uma base falsa para a segurança de salvação. As Escrituras deixam muito claro que ninguém é justificado pelas obras da lei (Rm 3.20; Gl 3.11).
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A pessoa que talvez mais incorporou este falso entendimento da salvação foi o jovem rico que se encontrou com Jesus durante o seu ministério terreno (Lc 18.18- 30). Talvez você lembre que, ao procurar a Jesus, o jovem rico lhe dirigiu um elogio: “Bom Mestre, que farei para herdar a vida eterna?” Ele estava perguntando a Jesus o que era exigido para ter a salvação.
Antes de responder a pergunta sobre os requerimentos da salvação, Jesus lidou com o elogio. Ele perguntou: “Por que me chamas bom? Ninguém é bom, senão um, que é Deus” (v. 19). Alguns críticos afirmam, com base nesta resposta, que Jesus estava negando sua bondade e divindade. Não, Jesus sabia muito bem que este homem não tinha uma ideia correta a respeito de com quem falava. Não sabia quem era Jesus. Não sabia que estava fazendo uma pergunta ao Deus encarnado. Tudo que o jovem rico sabia era que a pessoa com quem ele falava era um rabi itinerante e queria uma resposta para uma pergunta teológica. Por isso, Jesus perguntou: “Por que você me chama bom? Você nunca leu Salmo 14.3: ‘Todos se extraviaram e juntamente se corromperam; não há quem faça o bem, não há nem um sequer’? Ninguém é bom, senão o próprio Deus”.
Isso parece absurdo? Afinal de contas, o tempo todo vemos pessoas que não são crentes fazerem o bem. Tudo depende do que queremos dizer com a palavra “bem”. O padrão bíblico de bondade é a justiça de Deus, e somos julgados tanto por nossa conformidade de comportamento à lei de Deus, quanto por nossa motivação ou desejo íntimo de obedecer à lei de Deus.
Vejo pessoas ao meu redor que não são crentes, mas praticam o que João Calvino chamou de “virtude cívica”, ou seja, elas fazem coisas boas na sociedade. Doam dinheiro para causas boas, ajudam os pobres e, às vezes, até se sacrificam em benefício dos outros. Elas fazem todo tipo de coisas admiráveis no nível horizontal (ou seja, para com as outras pessoas), porém não fazem nenhuma dessas coisas porque seu coração tem um amor puro e completo por Deus. Nisto pode estar envolvido o que Jonathan Edwards chamou de “autointeresse iluminado”, mas ainda é autointeresse.
Uma vez ouvi a história de um incêndio trágico. Um edifício pegou fogo, e houve uma agitação para resgatar as pessoas que estavam em meio ao fogo. Os bombeiros entravam e saíam com tantas pessoas quantas eles podiam, mas logo ficou muito perigoso retornar ao edifício. Então, eles souberam que havia uma criança presa no edifício, e, dentre a multidão de espectadores, um homem, ignorando o perigo, correu para o edifício, enquanto todos na rua o aclamavam. Alguns minutos depois, ele retornou vivo e seguro, trazendo algo em seus braços. As pessoas continuaram a aclamá-lo, pensando que ele tinha resgatado a criança. Mas, por fim, descobriram que ele resgatara as economias de sua vida e deixara a criança morrer.
Creio que é possível um incrédulo entrar às pressas num edifício para salvar uma criança, talvez até ao custo de sua vida. Isto é virtude cívica, motivada pelo interesse pessoal que temos uns pelos outros. Mas essa virtude externa não é suficiente. Quando Deus olha para uma ação humana, ele pergunta: “Esta obra procede de um coração que me ama plenamente?” Lembre os mandamentos de Jesus: “Amarás o Senhor, teu Deus, de todo o teu coração, de toda a tua alma, de todas as tuas forças e de todo o teu entendimento; e: Amarás o teu próximo como a ti mesmo” (Lc 10.27). Portanto, se alguém obedece à lei exteriormente, enquanto seu coração não está totalmente entregue a Deus, a virtude desta pessoa está contaminada. Foi por isso que Agostinho disse que até as nossas melhores virtudes são apenas erros esplêndidos. Enquanto estivermos neste corpo de carne, o pecado contaminará tudo que fizermos. Isso era o que o jovem rico não entendia. Ele achava que havia atingido o padrão.
No Novo Testamento, Paulo adverte que aqueles que julgam a si mesmos com base em si mesmos são insensatos (2 Co 10.12). Podemos olhar para o desempenho de outra pessoa e pensar que, se nos guardarmos de adultério, assassinato, fraude ou algum tipo de pecado grave, estamos fazendo o bem. Visto que sempre achamos pessoas que são mais pecaminosas do que nós, é fácil concluirmos que estamos indo muito bem.
Essa era a mentalidade do jovem rico que foi ao encontro de Jesus. Ele pensava que Jesus era um homem bom. Mas Jesus o impediu de prosseguir naquele assunto e lhe recordou a lei: “Não adulterarás, não matarás, não furtarás, não dirás falso testemunho, honra a teu pai e a tua mãe” (v. 20). Isso fez com que o homem revelasse seu entendimento superficial da lei. Ele disse: “Tudo isso tenho observado desde a minha juventude” (v. 21). Em outras palavras, o jovem rico estava dizendo que havia guardado os Dez Mandamentos durante toda a sua vida.
Jesus poderia ter dito: “Bem, percebo que você não ouviu o Sermão do Monte, quando expliquei as implicações mais profundas destas leis. Você perdeu aquela palestra”. Ou poderia apenas ter dito ao homem: “Você não guardou nenhum destes mandamentos desde que levantou da cama nesta manhã”. Em vez disso, ele usou um lindo método pedagógico para ensinar ao homem o seu erro. Jesus disse: “Uma coisa ainda te falta: vende tudo o que tens, dá-o aos pobres e terás um tesouro nos céus; depois, vem e segue-me” (Lc 18.22).
Neste ponto, Jesus não estava ensinando um novo caminho de salvação. Não estava dizendo que podemos ser salvos por doar nossos bens aos pobres. Também não estava implementando uma ordem universal para que as pessoas se despojassem de todas as suas propriedade privadas. Jesus estava lidando de maneira particular com este homem, um homem rico cujo coração era totalmente capturado por sua riqueza. Seu dinheiro era seu deus, seu ídolo. Em essência, Jesus lhe disse: “Você diz que tem guardado todos os Dez Mandamentos. Certo, vamos examinar o primeiro mandamento: ‘Não terás outros deuses diante de mim’ (Êx 20.3). Vá e venda tudo que você tem”. Depois disso, o homem que fora tão entusiasta momentos antes começou a balançar a cabeça. Ele se retirou muito triste, porque tinha muitas possessões (v. 23).
Todo aquele encontro dizia respeito à bondade. Temos bondade suficiente – justiça suficiente – para satisfazer as exigências de um Deus santo? Cada página do Novo Testamento testemunha a verdade de que toda a nossa justiça é como trapos de imundícia (Is 64.6). Não podemos fazer o suficiente para sermos salvos. Somos servos inúteis (Lc 17.10).
Trecho do livro: “Posso saber se sou salvo?”, lançamento de Fevereiro de 2013, da Editora Fiel.

Posso Saber se Sou Salvo? (R. C. Sproul)

Eu confiei em Cristo, ainda estou salvo?
Muitas pessoas que frequentam igrejas cristãs sofrem com dúvidas sobre sua salvação. Muitos pensam ser impossível que pecadores possam se encontrar em tal estado de graça que têm certeza de sua salvação. Outros, todavia, estão certos de que são salvos, quando,de fato, não o são.
Neste livro, o Dr. Sproul mostra que a segurança da salvação é algo possível e bíblico. A fim de ajudar os cristãos a alcançarem esta confiança, o Dr Sproul define o que é segurança, mostra como é possível obtê-la e revela as bençãos que ela oferece bem como os perigos da falsa segurança.

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