No evangelho revela-se o amor que Cristo tem para com o Pai, bem assim os maravilhosos frutos desse amor, particularmente em fazer ele tão grandes coisas, e em padecer tantas coisas em obediência à vontade do Pai e para a honra de sua justiça, lei e autoridade, como o grande governante moral. Ali se revela como o Pai e o Filho são um em amor, para que nos deixemos induzir, em semelhante espírito, a ser um com eles e uns com os outros, em concordância com a oração de Cristo em João 17.21-23: “A fim de que todos sejam um; e como és tu, ó Pai, em mim e eu em ti, também sejam eles em nós; para que o mundo creia que tu me enviaste. Eu lhes tenho transmitido a glória que me tens dado, para que sejam um, como nós o somos; eu neles e tu em mim, a fim de que sejam aperfeiçoados na unidade, para que o mundo conheça que tu me enviaste, e os amaste como também amaste a mim”.
O evangelho nos declara ainda que o amor de Deus era eterno, e nos lembra que ele amou aos que são redimidos por Cristo desde a fundação do mundo; e que ele os deu ao Filho; e que o Filho os amou como seus. Ele revela ainda o maravilhoso amor do Pai e do Filho, respectivamente, para com os santos que estão na glória – que Cristo não só os amou enquanto no mundo, mas que os amou até o fim (Jo 13.1). E todo este amor é expresso como nos sendo outorgado enquanto errantes, proscritos, indignos, culpados e inclusive inimigos. Este é o amor que jamais foi conhecido em outro lugar, ou concebido: “Ninguém tem maior amor do que este: de dar alguém a própria vida em favor de seus amigos” (Jo 15.13); “Dificilmente alguém morreria por um justo; pois poderá ser que pelo bom alguém se anime a morrer. Mas Deus prova seu próprio amor para conosco, pelo fato de ter Cristo morrido por nós, sendo nós ainda pecadores. Porque se nós, quando inimigos, fomos reconciliados com Deus mediante a morte de seu Filho, muito mais estando já reconciliados, seremos salvos por sua vida” (Rm 5.7-10).
Deus e Cristo aparecem na revelação evangélica como estando vestidos com amor; como estando assentados, por assim dizer, em um trono de misericórdia e graça; um trono de amor, cercado dos mais suaves raios de amor. O amor é a luz e glória que circundam o trono em que Deus se acha sentado. Isto parece estar implícito na visão de Deus na ilha de Patmos: “Esse que se acha assentado é semelhante no aspecto a pedra de jaspe e de sardônio, e ao redor do trono há um arco-íris semelhante, no aspecto, a esmeralda” (Ap 4.3); isto é, ao redor do trono no qual Deus estava sentado. De modo que Deus lhe apareceu enquanto estava sentado em seu trono, envolto por um círculo de uma luz excessivamente suave e agradável, como as belas cores do arco-íris, e como uma esmeralda, que é uma pedra preciosa de cores excessivamente agradáveis e belas – assim representando que a luz e glória com que Deus, no evangelho, aparece cercado é especialmente a glória de seu amor e de sua graça pactual, porquanto o arco-íris foi dado a Noé como um emblema de ambas. Portanto, é evidente que este espírito, sim, o espírito de amor, é o espírito sobre o qual a revelação evangélica especialmente expõe os motivos e os estímulos; e este é especial e eminentemente o espírito cristão – o espírito correto do evangelho.
Ademais, tudo o que é salvífico e distintivo no verdadeiro cristão está resumidamente compreendido no amor, assim, os que professam o cristianismo nisto podem ser ensinados quanto às suas experiências, sejam elas ou não experiências realmente cristãs. Caso o sejam, então o amor é a suma e substância de tais experiências. Se as pessoas possuem a verdadeira luz celestial, que em suas almas ela não seja uma luz sem calor. O conhecimento e o amor divinos vão sempre juntos. Uma visão espiritual das coisas divinas sempre estimula o amor na alma, e atrai o amor ao coração, em cada objeto próprio de ser amado. As genuínas descobertas do caráter divino nos dispõem a amar a Deus como o bem supremo; elas unem o coração a Cristo, em amor; inclinam a alma a transbordar de amor para com o povo de Deus e para com toda a humanidade. Quando as pessoas possuem uma verdadeira descoberta da excelência e suficiência de Cristo, o efeito é o amor. Quando experimentam uma convicção correta da verdade do evangelho, tal convicção é acompanhada do amor. Tais pessoas amam a Cristo, o Filho do Deus vivo. Quando se visualiza a veracidade das gloriosas doutrinas e promessas do evangelho, estas doutrinas e promessas se assemelham a tantos acordes que emanam do coração e o impulsionam a amar a Deus e a Cristo. Quando as pessoas experimentam uma genuína confiança e segurança em Cristo, elas confiam nele com amor, e assim sucede com a deleitosa e doce aquiescência da alma. A esposa se pôs assentada sob a sombra de Cristo com profundo deleite, e descansou suavemente sob sua proteção, porque ela o amava (Ct 2.3). Quando as pessoas experimentam o verdadeiro conforto e alegria espiritual, essa alegria provém da fé e do amor. Não se regozijam em si mesmas, mas em Deus que é sua insondável alegria.
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